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terça-feira, 18 de junho de 2013

História se faz na rua [ou os protestos, parte II]

O dia 17 de junho de 2013, segunda-feira, já será marcado por levar às ruas, como há muito tempo não se via no país, milhares manifestantes protestando em uníssono, ao mesmo tempo. Em São Paulo, o Datafolha estima em 65 mil participantes - eu, lá no meio, sinceramente, asseguro com base no preciso sistema de medição Olhômetro que havia mais que isso. Bem mais que isso:

_início da concentração, no Largo da Batata. Foto: Miguel Schincariol/AFP
_Parte dos manifestantes na Avenida Paulista, quando o movimento dispersou para a ponte Estaiada e o Palácio (?) dos Bandeirantes. Foto: Márcio Fernandes/Estadão Conteúdo 

E vale ver as imagens aéreas da TV Folha:



Enfim, queria continuar a exposição de minhas ideias com base no entendimento no que estou lendo e acompanhando entre meus amigos próximos/participantes do Movimento Passe Livre (MPL) e também baseadas nas reações dos mais diversos perfis de coleguinhas. Nunca é demais ressaltar:

1. Não são R$ 0,20; mas também não é "corrupção"
Digno o apoio de todo mundo depois da covardia da ação da PM na quinta-feira, 13, descendo chumbo na geral. Foi um recado de que eles não podem calar insatisfações e manifestações, e todo mundo tem uma - seja a inflação, a corrupção dos reaças, etc. Como disse no post anterior, "diversos interesses que nasceram com nossa incapacidade de conseguir o que queremos".

O movimento possui, porém, um propósito. Não são 20 centavos (são 40, porque é ida e volta), mas ainda é o transporte público de qualidade. Começa que a raiz desse problema engloba a corrupção e desvios de verbas entre os consórcios que exploram cada atividade do transporte, a terrível condição do trânsito da cidade, a superlotação e tratamento desumano de todo mundo dentro de um veículo abarrotado de gente, a falta de corredores de ônibus e linhas de metrô, o tempo que se gasta para se deslocar de uma área a outra - decorrente do péssimo [ou seria ausência de?] planejamento urbano que concentra centros empresariais e econômicos em áreas de elite e segrega pobres, pretos e marginalizados em áreas distantes.


_minha visão no metrô e no ônibus, respectivamente. @stripolias

ESSA é a causa do protesto. ESSA é a situação que exige uma ação imediata, a começar pela revogação do aumento da passagem, já abusiva. Claro que queremos mais educação, saúde, menos desvio de dinheiro de Copa, o fim da inflação (que prejudica mais os pobres que os classe média, vale frisar), e [quase] tudo aquilo que os textos circulantes nas mídias sociais falaram. Mas mesmo o lado direitista das ruas - sim, ele existe, e a diversidade de pensamento faz parte do processo democrático - é afetado por essa questão do transporte público e deve sim se informar e abraçar a causa. Você, playboy, que saiu à rua ontem, pense que o trânsito seria menor se todo mundo pudesse ir e vir coletivamente, acomodado, melhor. E até você, empresário, produziria bem mais e teria um ambiente de trabalho bem melhor se seu funcionário não se espremesse duas horas no transporte para chegar à empresa.

2. Manifestação não é festa
Me incomoda o clima de festa. Acredito que gritos bem humorados são importantes para deslegitimar autoridades como a PM e até mesmo para grudar na cabeça das pessoas. Acredito que o humor faz pensar, o humor quebra barreiras do que costumamos colocar num pedestal como algo inalcançável, ou uma situação política opressora, tirando sarro do lado mais forte, claro.

Mas manifestação não é festa!

É reivindicação! É busca de direitos! É a criação de uma situação tensa para que os tomadores de decisão não vejam saída senão FAZER ALGUMA COISA! Não é pintar o rosto e sair bonitinho para ~postar a fotinha no Instagram~, é gritar, é explodir sua raiva no grito.

Reafirmo minha posição favorável a pichações políticas, a exemplo de stêncils, para deixar rastro e captar aquele cara que está esmagado dentro do busão, voltando para casa no dia seguinte, e despertar nele sua revolta.

3. Pluripartidário, não apartidário ~meu ponto polêmico do post~
Ouvimos muito essa história de que o movimento não tem partido, e algumas pessoas inclusive tentaram abaixar as bandeiras do PSTU, PSol, PCO, PC do B que se levantavam à frente do movimento.

Acho essa atitude totalmente anti-democrática.

Historicamente, esses partidos esquerdistas [e nanicos, convenhamos] fazem importante oposição aos governos do PT e PSDB, polarização majoritária do cenário político brasileiro, que jogam as regras do jogo de alianças conforme interesses elitistas. A democracia, a rua, é muito maior que um movimento estudantil. Óbvio que eles representam uma minoria. Óbvio que nem todo mundo tem partido, e que a maioria é sem partido. Portanto, a realidade é pluripartidária, não apartidária, e impor um cale-se, seja a ele quem for, é anti-democrático. Levante um cartaz "sem partido", "paz pluripartidária", "política se discute ideias", sei lá. Sejam criativos.

4. Sofativismo é importante

Olha, nem sei se precisaria desse tópico, mas ainda tinha gente na minha timeline de mimimi hoje sobre isso. Olha, usando a metalinguagem, se não fosse a web não seria possível ter discussões de ideias e exposição de imagens cruas e sem edição como estamos vendo até agora.



Eu sequer seria capaz de ler tudo que eu li da fonte original do MPL sem ter que me deslocar até uma de suas reuniões! Claro, existem algumas fontes cujas opiniões vão mais longe por conta de sua influência, essas têm um peso maior que meus textos e reflexões, por exemplo. Mas o poder de disseminação da rede é inegável - principalmente quando ele sai do online e chega no offline.
Atenção: são debates de ideias. Não reclamações infundadas.

5. Ações injustificadas não deslegitimam o movimento
Infelizmente, há atos de vandalismo e eles são claramente minoritários. Enquanto escrevo este texto, acompanho imagens de um carro link da Record sendo incendiado. Simplesmente ridículo e inócuo em termos de efetividade.

Sério, não sejamos ingênuos e acreditamos na ~mudança de opinião repentina doJabor~, que historicamente sempre defendeu ideais elitistas. Mas isso se combate com IDEIAS, usando a rede para disseminar relatos, debates.

Essas ações, contudo, não deslegitimam a manifestação como um todo, porque a causa [ver item 1] continua lá, não resolvida, e a ampla maioria propriamente condena esses atos. Igualmente vergonho agredir policiais, tão vítimas quanto nós, de um sistema falho e ineficaz. Afinal de contas, mesmo aqueles PMs que pensam bosta e acham que tem que meter bala em todo mundo, são seres humanos. Pensar em meter balas neles nada mais é do que fazer o que deles criticamos.

Aproveitando: segue a foto de uma dessas pessoas que encabeçaram destruições desmedidas. Está circulando no Facebook, tomara que achem e identifiquem esse imbecil. [viva, de novo, a sociedade digital. Todos nós temos uma câmera na mão]



6. Ainda estamos aprendendo (e cuidado com o que você deseja)
Não sabemos direito onde isso vai chegar. Não sabemos o que é protestar de fato desde quando? 1992, Impeachment do Collor? São tentativas. Melhor do que ficar reclamando nas redes sociais, como ainda tem gente falando "ah, não vai dar em nada"; ou "um bando de desocupado".

Não vamos usar isso para pedir causas absurdas. Já vi gente falando "Fora, Dilma" que, além de ser completamente desconexo com a questão do transporte, representa uma ação que não gera solução nenhuma. E importante:




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Eu, Gabriela, jornalista de tecnologia, 26 anos, saí do trabalho às 17h30 para ir à praça da Sé, mas não consegui porque um "problema" em composição na estação Morumbi, da CPTM, interrompeu a circulação de trens por mais de 40 minutos. Às 19h, depois de um ônibus absurdamente lotado e uma fila de 20 minutos para entrar na estação Faria Linha, metrô, linha amarela, me deparei com apenas UMA CATRACA de saída nas estações Sé e São Bento, região central de São Paulo. Vim pra casa e escrevi este post.

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